quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Auto da Barca do Vitória

“Jasus, que texto tão grande. Não o vou ler.” Pois é, nunca querem ouvir os argumentos...

Não vou mentir. Gosto de futebol. Não sou como os que dizem que não ligam, mas que ficam com a cabeça vermelha quando corre mal para o seu clube, ou como os que também dizem que não ligam, mas estão sempre com atenção ao clube dos outros. Gosto que o meu clube ganhe, detesto quando empata, odeio quando perde, não gosto que seja prejudicado e muito menos que seja beneficiado.

Não sou doente. Doente é quem provoca para ver se incendeia. Do género “Ei, foi uma roubalheira!”. E, sem dar tempo para a contraprova, vira-se para outrém e muda de assunto – “Quanto ficou o Real Madrid?”. Se há pessoas assim, mais vale falarem sozinhas, seja de que assunto for, do mais efémero (como este) ao mais importante.

No ano passado não era legítimo falar de erros de julgamento no futebol. Não sei porquê, devia de ser decreto-lei e eu não sabia. Havia só uma verdade adquirida: Jorge Jesus era o “novo Mourinho” e o Benfica foi a melhor equipa a jogar futebol na Europa – foi eliminado com uma goleada com o Liverpool da Liga Europa e ganhou o campeonato na última jornada. Lembro-me, por exemplo, de uns golos mal anulados num Porto-Belenenses, Porto-Paços de Ferreira... Um penalty por assinalar no Leixões-Porto. Tudo lances com influência directa nos resultados dos jogos a que dizem respeito. Ao todo eram mais 6 pontos que alterariam a tabela do campeonato até ao segundo lugar. Já nem digo até ao primeiro, porque aí tínhamos que remontar ao dito “túnel”. E caía tudo em cima de mim, porque idolatro um tipo que andou à cacetada a um inocente e porque para mim é para andar assim à porrada e mau-perder. Pois simplesmente acho... Tenho a certeza, a lei só previa um número de jogos de castigo que se contava pelos dedos de uma mão. Foi assim na Alemanha, esse país de terceiro mundo afinal. Se calhar eu estou errado e não se deve seguir o exemplo desses germânicos rudes.

Outros até concordarão comigo mas dirão: “Lá vens tu falar do passado! O Benfica jogou o melhor futebol, mereceu!”. Pois não é tão passado assim. É bem presente, pois hoje estávamos nós a defender o título (Penta), estávamos mais recheados de dinheiro da Champions League. E não sei como seria para o Benfica falhar novamente o título no ano de todas as expectativas. Perde-lo de facto a jogar lindamente e a golear, contra uma equipa de altos e muitos baixos. Mas pronto, doente é o míope que não vê as coisas na sua totalidade.

Falemos de presente concreto. Há uma equipa com razões para se queixar de quatro lances com influência directa no resultado que obteve contra o Guimarães. Não falo do Benfica, esse já sabemos. Em resumo: o defesa Ricardo teve entradas merecedoras de punição, que não a obtiveram – fez a assistência para o golo do empate; Falcao teve dois fora-de-jogo mal assinalados, pelo menos um cara-a-cara com o guarda-redes; reclama-se penalty na área do Guimarães por mão na bola.

À imagem do Benfica, que viu um penalty por marcar fora da área, o dito penaltyi tal não foi. No entanto, estar isolado frente a frente ao guarda-redes tem tanta influência directa num resultado como um penalty. E uma assistência para um golo que aconteceu também tem, digo eu. Pois agora entra em acção a miopia. Vejamos, só viram um penalty por puxão de Fucile ao Edgar (não viram a resposta, nem ouviram que se apitou antes do puxão) após várias repetições já após o jogo, viram entradas do fucile, que acabou por ser expulso, e não viram as entradas do Edgar, Ricardo e João Paulo sobre o Falcao e o João Moutinho (esta até deixou marca). A legitimidade de mandar os ditos bitaites sobre a justiça da acção disciplinar existe? Claro que não. Vejamos o exemplo da Champions League, em que o Chelsea foi “assaltado” no jogo com o Barcelona, aqui há uns anos. O jogo foi válido, os jogadores com protestos foram castigados e o assunto morreu. Mas, se uns podem reclamar, exigir explicações e pedir intervenção do Estado, esse direito também pode ser exercido por qualquer um que tenha uma versão sobre o acontecimento das coisas. E, lá em baixo, um pode-se levantar do banco, rebolar, saltar, berrar, protestar, fazer gestos com as mãos, etc. Cá em cima, o novato faz isso uma vez e leva logo cartolina.

A miopia segue: Naval-Porto “Porto ajudado com penalty” – é mesmo mão na bola; Rio Ave-Porto “perdoam penalty” – intervem um jogador na jogada em fora-de-jogo.

Quanto aos lances que realmente beneficiaram o Porto, quero simplesmente que duvidem deles com tanta intensidade como aqueles que falei no início do mail relativos ao ano passado. Lá venho eu falar do passado, que não tem nada a ver. Então devem ter nascido numa nova reencarnação ontem, e os seus critérios já são diferentes dos do ano passado.

Esquizofrenia é também uma doença e caracteriza-se pela visualização de fantasmas. Quando vejo escutas com desabafos pessoais, tácticas de patrão para um funcionário de uma empresa, serem expostas como provas aceites publicamente para acusar alguém, fico estupefacto. Qualquer dia sou preso por ter dito a alguém o que estava a fazer quando estava no wc a fazer as necessidades e lhe liguei. Agora quando vejo escolhas e coacção sobre árbitros, quero ver essas pessoas julgadas. Tanto aquele que os recebe em casa, como aquele que escolhe “aquele, o João, pode ser esse”. Ou aqueles que enviam ameaças de morte a árbitros. Mas, lá está, a miopia não deixa ver estes parágrafos.

Continuamos num país de apoio a só uma cor, que continua a mandar para a jarra árbitros que sancionaram uma mão na bola por um toque que existiu mesmo, idolatrando aqueles que marcam mão na bola por bola no peito.

Doente é aquele que não quer ver...