quarta-feira, 3 de março de 2010

Invasão Klingon

A história é simples, minha gente. Um gajo nasce, cresce, come como um burro, quem não é burro vai para a escola e, mais tarde, para a Universidade. Quando esta fica longe da aldeola de onde vimos, procuramos casa. Sendo esta uma necessidade colectiva, partilhamo-la, em muitos casos.

Relatamos hoje o caso de um desgraçado que partilha a casa com três lindos marcianos. No início era fácil. Vivia com o senhorio que lhe ensinou as regras lá do forte: tolerância óbvia mas sentido de responsabilidade. Após a saída deste, vieram outros e completou-se o grupo de hoje. O desgraçado vive literalmente desgraçado.
Vai de férias e certifica-se que deixa tudo limpo dentro dos possíveis. Volta de férias e está tudo borrado com uma sertã a ganhar podridão. Sai de manhã de casa e vê um zombie no sofá a coçar o esquerdo. Chega à noite cansado e vê o mesmo zombie no mesmo sítio a coçar, desta vez o direito. Estado da casa: o mesmo. O que está sujo, sujo está.

Vem o senhorio mais a namorada, fazer uma visita. E a sua voz severa e palavrões profundos recaem sobre todos. Mas quem leva com elas é o desgraçado do inquilino. Ele e a namorada do senhorio olham-se nos olhos. Não, não é qualquer tipo de faísca ou química. É mais um sentimento comum de "tirem-me daqui": ela quer passar tempo de qualidade com o namorado e ele quer é ir dormir porque o dia foi cansativo. Sim, porque os klingons mais não fazem do que ir às aulinhas de manhã e ficar em casa toda a tarde (ou por ordem inversa). O desgraçado do troglodita que os atura tem aulas de um curso de manhã, aulas de outro curso de tarde e trabalho à noite. E ainda chega a casa e tem que gramar com os bilhetinhos na porta do frigorífico a dizer "as tarefas (..) são para ser efectuadas por todos de forma colectiva". Sensato, enumera mais tarefas que devem ser colectivas, explica que tem pouco tempo para monitorizar tais necessidades em relação aos outros, admitindo que também se sente na obrigação. Pois, pouco tempo depois, os meninos tinham lá ido ler a resposta no bilhete, mas só deram importância à parte de o outro coitado ter obrigações como os outros, sublinhando tal citação.
Não acaba aqui. Há a história do lixo que se acumula na semana em que o desgraçado só vai a casa para dormir e que o próprio tem que levar na semana seguinte ao contentor, não porque se sente na obrigação, mas porque já não se aguentava com o cheiro. Há a história de um que acaba os exames e se põe a andar e o desgraçado, no meio dos seus exames tem que gramar com o papá desse primeiro a mandar vir porque não limpa a casa. Há a história da janela que todos fecham e o desgraçado abre; depois a caldeira avaria por acumulação de gases e quem ouve o senhorio é... O pobre coitado. Há a história do coitado que usa água fria para lavar louça, mãos, cara e se barbear de modo a poupar gás e os outros fazem-no sempre com a água quente, seja Verão ou Inverno. Há pano para mangas.

O inquilino azarento ainda tem que partilhar o quarto com um outro marciano que ressona e respira alto a dormir, conforme qualquer um de nós. Tudo bem, também deve levar com o mesmo. Mas depois há o atender o telemóvel enquanto o outro dorme (acordando-o, claro), deitar-se tarde e ocupar o quarto a manhã toda enquanto o outro quer estudar... Mas a mais nojenta será os sons que faz que metem impressão ao desgraçado. E emite-os acordado. Ele é "hum", "ahhhhhhhhhhhh", "hu hu"... Ora é catarro, ora é descontração muscular, ora é engolir saliva... Quase parece um orgasmo. Ficamos a pensar "Ó pá, vai mas é para um canto, senta-te e morre de uma vez!".

O pobre coitado era o único que ficava até à sexta-feira de noite. Pronto, tinha que ficar a trabalhar nessa noite. Aproveitava e gozava da privacidade de que dispunha para se pôr mais à vontade. Adivinhem lá... Os meninos à volta da fogueira também se lembraram de ficar. A fazer o quê? Desta vez é mais arrojado: coçam os dois ao mesmo tempo - esquerda, direita, esquerda, direita, esquerda... Um dia destes ainda vai estar em carne viva!

Está toda a gente no seu direito. Apenas este pobre coitado teve azar. Atenção que, no universo das casa partilhadas há muito pior. Ele que o diga, que ouve vizinhos a gritar uns com os outros, sabe-se lá porquê. Ele também falha, e tenta ser homem o suficiente para admitir. Mas há limites.

Podemos não ser as melhores pessoas do mundo. Eu, por mim falo, sou a pior pessoa do mundo. A sério, não me queiram conhecer porque sou mesmo mau género, repugnante. Mas até a pior pessoa da história, quando obrigatoriamente integrada numa sociedade, precisa de condições para essa integração. Precisamos ser compreendidos e respeitados pelo trabalho que temos e pelas asneiras que não fazemos. Tirem-me deste filme, pá!

2 comentários:

cara cool disse...

Há que pôr esses ociosos mais ciosos das suas obrigações. Isso aí vai uma relação um bocado desequilibrada, não?

@shitspeecher disse...

Acho que o gajo só quer que o deixem em paz e não o chateiem lá por casa...